domingo, 19 de setembro de 2010

Navegantes

No horizonte, era possível ver uma mancha sobre o azul do oceano. Um navio se aproximava.
Depois de algumas horas já era possível divisar os contornos da embarcação.Um galeão branco, todas as velas de seus quatro mastros enfunadas e os remos todos trabalhando sincronizados, se aproximava da costa.
Uma agitação percorreu o porto, um dos trapiches foi liberado para que a embarcação pudesse ali ancorar. Mais algumas horas se passaram e a Lembrança da Lua finalmente ancorava no porto norte da província de Arad. Uns quatro pares de marinheiros de pele escura queimada de sol trajando vestes pardacentas estenderam a prancha de desembarque e desceram por ela. Ávidos por pisar em terra firme, descarregaram com destreza as várias caixas que levavam no porão do navio. De todas elas, uma se destacava pelo seu formato peculiar, diferente das outras. Longilínea e achatada, uns dois passos de comprimento por um braço de largura e uns três ou quatro palmos fechados de altura e ornada apenas o suficiente para um observador casual saber que seu conteúdo era de alguma valia. Logo, um marinheiro se destacou do grupo e em poucos minutos voltava com uma carroça grande o suficiente para levar todas as caixas.
A caixa ornada foi carregada primeiro. Todas as outras seguiram e dois marinheiros acompanharam o chofer. O capitão da bela embarcação ainda não havia sido visto. Um outro marinheiro providenciou outra carroça para os levar para onde quer que a outra carroça estivesse indo.
As carroças se afastaram e em pouco tempo sumiram em meio às pessoas que ali transitavam a pé e em charretes, carroças e cavalos. Uma porta na cabine do galeão se abriu e por ela saiu uma figura distinta. Chapéu negro de capitão com uma pluma vermelha como sangue, trajes rubros e longos cachos cascateando por sobre os ombros, o cabelo quase da mesma cor das muitas saias do vestido. Uma camisa negra como a noite escondia seu colo, saindo de baixo de seu espartilho não muito apertado. Sua pele muito branca contrastava com a profundidade dos olhos negros, ressaltando os traços marcantes e, se não muito belos, definitivamente inesquecíveis.
Logo atrás dela um jovem pouco mais velho que ela mesma e com feições semelhantes, longos cabelos vermelhos como o fogo amarrados em um rabo de cavalo baixo, camisa vermelha, colete negro, uma bandana negra protegendo a cabeça, calças e botas negras fechando o conjunto. Os dois eram uma visão surpreendente em uma embarcação tão vistosa e tão delicada ao mesmo tempo, branca como a lua.
Colocando os indicadores e dedos médios das duas mãos entre os lábios, ele soltou um longo assovio, um tom penetrante e desconcertante, que foi respondido por um guincho infernal vindo do porão do navio. Escotilhas foram abertas no casco do navio e mais rápido do que o olho consegue acompanhar, formas negras saíram por elas e alçaram vôo antes que se conseguisse distinguir o que eram. Passantes e marinheiros dos outros navios se refugiaram onde puderam para se proteger do que quer que fossem aquelas coisas tenebrosas.
Uma centena de sombras negras saíram do navio antes que o assovio cessasse e os guinchos horripilantes ficassem distantes o suficiente para as pessoas saírem de seus esconderijos. O homem e a mulher trajados de vermelho e preto desceram, então, pela prancha de desembarque de seu navio. Com apenas um gesto da mão dele, a prancha voltou sozinha para seu lugar dentro do navio e as velas desceram e se enfunaram, a âncora subiu e os remos saíram por suas escotilhas e começaram a trabalhar, levando o navio para longe do porto.
Ele estendeu o braço para ela e os dois saíram andando. Por onde passavam, as pessoas abriam caminho para eles, com medo, até que os dois se misturaram também à multidão de passantes que não haviam visto a cena no píer e não foram vistos tão cedo...




Lembrando: tudo o que é escrito aqui acontece eventualmente ou já aconteceu, e não pode ser mudado ;]